29 maio 2007

OS PEDROS E SEUS BRASIS

(Passado, presente e futuro de dois criminosos brasileiros)

Por uma dessas inexplicáveis coincidências cósmicas, Pedro e Pedro nasceram no mesmo dia, na mesma cidade e receberam o mesmo nome: Pedro Henrique Santana. Mas, por uma dessas perfeitamente explicáveis circunstâncias humanas, cada Pedro nasceu num país diferente, a despeito de a cidade ser a mesma.

Um dos Pedros nasceu no Brasil emergente, a décima-segunda economia mundial, o país cuja moeda mais se valorizou nos últimos anos, o Brasil que está entre os primeiros do ranking de compradores de celulares, jatinhos e cuecas com bolsos internos.

O outro Pedro nasceu no Brasil pobre, campeão de desigualdade, o Brasil das favelas, o Brasil em que a maioria da população não tem acesso sequer aos serviços mais básicos.

O Pedro pobre não gostava de estudar. No Ensino Fundamental, ia para a escola por obrigação, porque a mãe tinha medo de se complicar com o Conselho Tutelar. No Ensino Médio, ia para a escola para namorar e beber com os amigos. No seu Brasil, estudou em escolas públicas, onde era aprovado mesmo que não atingisse os resultados mínimos - em parte porque alguns professores queriam se livrar dele, em parte porque a Secretaria de Educação obrigava as escolas a aprovar o maior número possível de alunos, só para engordar as estatísticas. Ele não sabe que profissão quer ter.

O Pedro rico também não gostava de estudar. Mas cresceu numa casa cheia de livros, jornais e revistas, com Internet e TV a cabo. Os pais o matricularam, desde muito jovem, em cursos de Inglês, Francês, Teatro, Judô e Informática. No seu Brasil, estudou em escolas particulares e fez o melhor cursinho pré-vestibular, ingressando numa concorrida Universidade pública após três tentativas. Ele não se importa muito com a futura profissão, pois vai herdar a empresa do pai, no fim das contas.

São estreitos os horizontes de um dos Pedros. Nunca saiu do seu estado, quase nada sabe sobre o resto do mundo e sua vida orbita entre o futebol, as festas com amigos e a luta pela sobrevivência.

O outro Pedro é cosmopolita. Passou várias férias em praias do Nordeste, conhece os Estados Unidos e a Austrália. Freqüenta os bons cinemas, janta nos melhores restaurantes, participa de festas badaladas.

O Pedro pobre ainda não sabe o seu futuro, mas eu sei (falo deste Pedro, e não de todos os pobres do Brasil, pombas!). Ele vai entrar no crime. Começará fazendo pequenos furtos com amigos. Depois, será preso num grande roubo. Na cadeia, aprenderá tudo que alguém precisa saber para se tornar um bandido perigoso. Depois de solto, será morto por uma milícia de justiceiros. E ninguém jamais saberá o seu nome.

O Pedro rico também vai entrar no crime. Começará sonegando impostos e desviando o FGTS dos funcionários. Depois, montará um esquema com o tio deputado para lavar dinheiro, fraudar licitações e traficar influência. Será preso numa mega operação da Polícia Federal, mas em seguida comprará a liberdade via habeas corpus concedido pelo Supremo. Seu nome aparecerá em todos os jornais como sinônimo de corrupção, mas na semana seguinte ninguém lembrará dele, que poderá voltar a roubar em paz.

É claro que esses futuros podem ser - e provavelmente são - apenas exageros tendenciosos deste colunista. O fato é que todos os Pedros, Joões, Marias, Anas, Josés, Carolines e Clébersons vivem na zona de convergência entre dois países tão diferentes e tão semelhantes. A tarefa de todo governante, empreendedor, intelectual, religioso, operário, camponês, artista, estudante, dona-de-casa, aposentado, desempregado e vagabundo deve ser contribuir para que acabe esse abismo de desigualdade, para que todos possamos viver no mesmo Brasil, um Brasil com oportunidades para todos, um Brasil onde o futuro de cada um seja decidido pela sua livre escolha e não pelas circunstâncias desfavoráveis ou pelos caprichos de um pretenso escritor.

Um comentário:

Anônimo disse...

Distribuição de renda, é tudo. Não precisa ser igualitária, mashumana; deumamaneira que as pessoas consigam ao menos sobreviver. Oportunidade ão deveria ser a palavra do Brasil, mas infelizmente vivemos isso. Quem tem mais oportunidade vive melhor, mas asoportunidades não são para todos e nem iguais!