25 agosto 2007

A HIPERTROFIA POLÍTICO-ESTOMACAL BRASILEIRA

Depois de muito refletir, tive uma Revelação (daquelas com erre maiúsculo) e descobri quem é o grande culpado pela tolerância crescente dos brasileiros à corrupção e à incompetência dos governantes. Essa Revelação aconteceu, é claro, no lugar mais propício para a meditação e a iluminação espiritual: uma lanchonete da Cidade Baixa.

Entrei lá com alguns amigos e, quando o garçom se acercou para anotar nossos pedidos, eu lhe disse que queria um xis coração e uma coca de 600ml. Minutos mais tarde, ele apareceu com os nossos lanches, entre eles o meu: um colossal sanduíche cujo recheio incluía ovo, queijo, milho-verde, ervilha, tomate, alface, maionese e corações suficientes para bombear o sangue de uns trezentos frangos, pelo menos. Mas o mais importante para a minha Revelação não foi o xis, e sim o que veio junto com ele: seiscentos mililitros de refrigerante de cola dentro de uma garrafa de plástico.


Comi aquele xis com todos aqueles corações, bebi toda aquela coca e fiquei saciado. Foi então que me pus a refletir e, como num passe de mágica, percebi claramente quem devemos culpar pela passividade do povo brasileiro perante os escândalos políticos. A culpa é toda das empresas de refrigerante.

O leitor está se perguntando, ou pelo menos deveria, o que têm a ver com isso os fabricantes de bebidas. Uma pequena viagem no tempo talvez nos ajude a entender a questão.

Antigamente, quando um cara entrava numa lanchonete e pedia um xis, ele bebia junto com o sanduíche uma garrafinha de refrigerante, daquelas de vidro. E ficava saciado. Sabe quanto refrigerante cada garrafinha daquelas continha? Duzentos e oitenta e quatro mililitros. Foi nessa época que o Collor perdeu o mandato por causa de um Fiat Elba.

Depois, mais ou menos na época em que o Fernando Henrique comprou alguns votos para aprovar a reeleição, o Toninho Malvadeza era rei em Brasília e ninguém entendia como o povo não se revoltava, sabe o que o brasileiro médio bebia para acompanhar o xis? Uma lata de refrigerante. Trezentos e cinqüenta mililitros. E era suficiente.


Hoje, vemos a corrupção chegar ao Supremo Tribunal Federal, vemos o Mangabeira Unger assumindo um posto no mesmo governo que afirmou ser o mais corrupto de todos os tempos, vemos a dança bizarra da Angela Guadagnin, e tudo isso só é aceito porque agora um sujeito precisa de 600 ml de refrigerante pra se sentir saciado.

Trata-se, sem dúvida, de uma grande conspiração da indústria de refrigerantes para nos tornar hiper-resistentes ao açúcar, ao ácido fosfórico e à sem-vergonhice dos políticos. Ora, o mesmo brasileiro que antes se contentava com 284ml de água gaseificada com sabor agora precisa de 600ml. Com isso, acabamos todos engordando, perdendo a noção dos limites e do tamanho do nosso estômago. Viramos máquinas de digerir porcarias. Nada mais nos deixa repugnados. Engolimos tudo sem pestanejar. Os deputados aumentaram os próprios salário de novo? Ah, a gente engole essa. É só tomar um Engov depois. As CPI's acabam em pizza? Hum, adoro pizza. Vou pedir uma Coca 2 litros pra acompanhar.

Por mim, basta. Eu estou decidido. Na próxima vez em que for a uma lanchonete, vou pedir o meu xis coração e um copinho d'água. Dos pequenos.

12 agosto 2007

ESSES BÊBADOS E SUAS HISTÓRIAS

Nenhum lugar do mundo é tão bom para se contar histórias quanto uma boa bodega. As histórias podem ser verdadeiras, inventadas ou um pouco de cada, dependendo do contador e da platéia. Foi em uma bodega que ouvi, da boca de um sujeito que parecia absolutamente confiável, a história de Lisarb.

Lisarb é uma estranha terra onde tudo é ao contrário.

Lá, a honestidade é um defeito e a malandragem é uma virtude. Quem rouba pouco passa muito tempo na cadeia e quem rouba muito sequer chega a ser preso.

A imensa maioria da população lisarbeira é constituída de pobres, mas foram necessários quinhentos anos para que um pobre chegasse ao poder - e primeiro ele teve que deixar de ser pobre. Por falar nisso, lá em Lisarb as universidades públicas são para quem tem dinheiro e quem não tem acaba estudando nas particulares. As escolas de Lisarb não ensinam e os alunos de Lisarb não aprendem, apesar de os pedagogos do país dizerem a todo mundo que a educação lisarbeira é moderna e libertadora.

Lisarb é um país onde os eleitores votam em corruptos mesmo sabendo que eles são corruptos. E os corruptos presidem CPI's em que fingem que julgam outros corruptos, para simular que trabalham nos poucos dias em que não estão fazendo de conta que visitam as bases. É também um país onde o presidente da Câmara dos Deputados declara que o salário dos congressistas "não é tão alto assim" e não leva sequer uma bofetada do entrevistador.

A estranheza de Lisarb é tal, que lá o povo paga impostos de Welfare State e recebe serviços de República de Bananas. As pequenas empresas lisarbeiras têm que fechar as portas porque não conseguem dar conta da carga tributária, enquanto o governo gasta bilhões socorrendo os bancos que não conseguem sobreviver mesmo extorquindo os clientes.

Como em Lisarb tudo é ao contrário, lá os jogadores de futebol, os cantores de pagode e as peruas siliconadas estão no topo da cadeia alimentar social, enquanto alguns professores universitários ganham menos que os motoristas de ônibus. Para se ter uma idéia da esquisitice do lugar, as maiores celebridades do país são os ex-participantes do GRL (Gib Rehtorb Lisarb), um programa de TV em que vários vagabundos passam semanas inteiras confinados em uma casa exercitando a arte da intriga e do ócio improdutivo, para deleite de milhões de desocupados e pederastas.

É desnecessário dizer que nenhum dos ocupantes da mesa acreditou nessa história. Uns balançaram a cabeça, para fazer de conta que gostaram, outros perguntaram se alguém sabia a última do português, pra mudar de assunto. Até o Valdir tinha um sorriso sarcástico nos lábios enquanto recolhia as garrafas vazias e passava um pano úmido na mesa. Mas a situação acabou ficando meio chata, pois o cara insistiu que era tudo verdade, quando todo mundo sabia que não pode existir um país assim. O jeito foi bater nas costas dele e dizer "Tá certo, tá certo..." Uma das principais coisas que se aprende numa bodega é que não dá pra contrariar um bêbado.